sábado, 26 de janeiro de 2013

Na hora era entre estancar a dor ou a alma


Sentia-se fraca demais. Patética, jogada no chão e chorando daquele jeito.
Tirou a mão que estava na altura do diafragma e viu seu sangue escorrer pelos dedos.
 "Levei um tiro", pensou de repente "mas por quê?" Não doía, na verdade era uma quentura gostosa que a invadia o corpo. "Caralho, que sede".
 - Á-água - gaguejou.
 Estranhos a sua volta ficavam gritando coisas sem sentido algum. Ela podia vê-los balbuciando e ouvir os sons de suas bocas, mas não conseguia compreende-los.
 - Á-água - tentou novamente. Sem sucesso.
 "Água! Por que meu corpo não me acompanha? É simples dizer 'eu quero água'". Impressão minha minha ou as pessoas estão em uma coloração diferente? Calma! Não fechem olhos..."
 - Ei, ei, fique acordada...
 As vozes estavam mais baixas. "Eu to com sono, não estou morren... CALMA! NÃO POSSO DORMIR!" Tentava lutar contra as pálpebras pesadas. "Esses filhos da puta não podem me dar um copo d'água?"
 Viu de longe uma sirene se aproximando e seu barulho a feria os tímpanos.
 - Aguente só mais um

sábado, 19 de janeiro de 2013

Solidão a dois

E lá estava. Rodeada de lágrimas de chuva.
Sabia que o tempo estava perfeito para ver um filme agarradinha com o namorado. Ou um romance pra chorar sozinha. Ou uma comédia romântica com a melhor amiga.
O céu estava branco de nuvens. Nuvens tristes: sem cavalos, ou rostos. Apenas o branco do céu.
Um sorriso surgia em sua boca. A sensação de solidão que nascia nas bordas de sua língua e escorregava até a ponta trazia um sabor adocicado.

Sabia que a solidão era uma coisa ruim e que todas as pessoas estavam a procura de alguém para envelhecer. Como podiam? Talvez fosse um pouco autista. Talvez as piadas que não foram ditas fossem mais engraçadas. Talvez fosse só a saudade daquele velho amor.
"Difícil é esquecer quando o mundo foi feito de ti". Ligou certa noite para dizer-lhe essas palavras, mas a vida não é um sonho... a ligação estava cortando e ele ficava repetindo "O que? O que?". Perdeu a magia, desligou.

Pensava em chegar em casa e ter apenas um prato para colocar na mesa e resolver comer em pé do lado da pia. E no silêncio que vai estar. Em trancar o portão porque sabe que mais ninguém vai chegar. Sentar sozinha no sofá. Sem conversar. Sem nem falar. Nem aquele silêncio gostoso quando estão lendo juntos. Nada disso.De repente ficou ansiosa para viver isso tudo. Pensou em dançar sozinha de calcinha na cozinha. Transformar o silêncio na voz de Freddie Mercury e entender exatamente o que ele quer dizer com "I want to break free". Suspirou. Que solidão gostosa.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Ana

 As pernas frágeis e trêmulas andavam em direção ao túmulo. "Ana deixou apaixonados, viúvos e a vida". Que lápide ridícula. Tentavam poetizar aquilo, mas era um lixo.
 Olhou fixa para aquelas palavras: "Ana deixou". Aquela não era a Ana que conhecia, aquilo não estava certo, não podia. Ana não abandonava. 
 Seu corpo magro já era tão fraco quanto suas pernas, quanto seu coração. Caiu de joelhos na terra fofa que ainda era fria. Como o copo de Ana.
 Agora lembrava daquela festa que foram juntas e Ana se vestira de morta. Não, ela não tinha noção de como ficaria morta. 
 - Morta... Morta...
 Cada vez que pensava nesse termo lhe era mais forte, mais destrutivo. 
 - Morta
E a machucava mais.
 - Morta... Ah, Ana...- suspirou sem deixar escorrer nem uma unica lágrima. Nem quente, nem fria. - morta...
 Quantos dias mais teria que conviver com aquela dor? Lembrou-se de um trecho: "tudo que morre fica vivo na lembrança, como é difícil viver carregando um cemitério na cabeça". Horas se passaram e aqueles pensamentos a destroçava. Aquela ideia de nunca mais estarem juntas. Aquele tempo que não voltaria. Horas se passavam e parecia que cada segundo a mutilava.
 - Ah, Ana... - sentiu seu sangue quente subir para cabeça. Podia senti-lo sair pelos olhos.
 Altos ruídos de dor que juravam ser de um homem sendo degolado por uma faca cega lhe escaparam pela garganta.
 - Ah, minha filha, por que eu bebi?

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Pelas raízes das rochas

 As cores vibravam, quase gemiam diante tanta luz, tanto calor. Estão em contraste as lágrimas que escorrem dos olhos dela. Ela que me faz bem. Ela que eu amo.
 Chorava sem piscar os olhos. Em seu rosto o que aflorava era o desgosto, a decepção. Em sua boca, um riso sínico, um gosto de vingança.
 Antigos pensamentos martelando arrependimentos atuais.
 Vozes estranhas declarando pensamentos próprios.
 Ruídos altos demais passavam atrás de sua música.
 Confusão interna, pessoal demais para externalizar.
 O mundo está assim, as casas voam, livres; as pipas se plantificam.
 Adeus, menina... Adeus a nós que sangramos sua voz... TUM, TUM!